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sexta-feira, 6 de março de 2015

Feminicídio: o que não tem nome não existe

O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou, em 03.03.2015, o Projeto de Lei 8305/14, do Senado, que inclui o feminicídio como homicídio qualificado, classificando-o ainda como hediondo.
O feminicídio constitui a manifestação mais extremada da violência machista fruto das relações desiguais de poder entre os gêneros. Ao longo da História, nos mais distintos contextos socioculturais, mulheres e meninas são assassinadas pelo tão-só fato de serem mulheres. O fenômeno forma parte de um contínuo de violência de gênero expressada em estupros, torturas, mutilações genitais, infanticídios, violência sexual nos conflitos armados, exploração e escravidão sexual, incesto e abuso sexual dentro e fora da família.
Vários países, principalmente na América Latina, criminalizaram o feminicídio, trazendo, em sua descrição típica, requisitos específicos e que se diferenciam de um local para outro. Têm-se aqui medidas penais gênero-específicas.
Essa tendência para a criminalização também chegou ao Brasil. O projeto de lei que criminaliza o feminicídio considera que há razões de gênero quando o crime envolve: a) violência doméstica e familiar; b) menosprezo ou discriminação à condição de mulher.
A criminalização do feminicídio tem provocado um intenso debate entre os estudiosos das questões de gênero (sociólogos, psicólogos, juristas etc.), alguns justificando a necessidade de criminalização da conduta e outros entendendo que ela já se encontra contemplada nos tipos penais existentes na legislação brasileira (homicídio qualificado, sequestro, vilipêndio de cadáver etc.).
Independentemente da posição por se criminalizar especificamente ou não o feminicídio, há consenso em relação à gravidade do problema e à necessidade de explicitá-lo, de torná-lo visível, para que seja conhecido e compreendido e, a partir daí, seja intensificada a sua prevenção. Isso, contudo, pede sensibilidade e mobilização social. A tarefa é por demais complexa para o Judiciário, que terá uma margem muito limitada de ação, já que a sua atuação é condicionada à existência do fato, ou seja, do crime. Não se pode esquecer que quando o Judiciário é chamado a atuar o bem jurídico já foi lesado. Às medidas preventivas, portanto, é que devemos dedicar a maior parte de nossa atenção.
Por longo tempo, as mulheres foram (e hoje ainda muitas o são) educadas a partir de valores de submissão e invisibilidade: no espaço privado, somente lhes era dado desenvolver os papeis de criadoras e cuidadoras; no espaço público, sobre elas se lançavam olhos, vozes e gestos de reprimenda, se fugissem do seu “atributo da natureza”. Aliás, mesmo um dos principais problemas de que eram vítimas, a violência, somente passou a ser estudado com mais afinco partir da década de 90 do século passado, quando então é visto como assunto de diretos humanos e de saúde pública.

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